Com ela se foram as histórias sobre o início da vida deles que eu nunca escutei. Com ela se foi a possibilidade de registrar essas histórias.

Com ela se foram todos os pontos de crochet que eu nunca aprendi.

Com ela se foram todos os carinhos que eu não ganhei, mas que a minha filha iria.

Com ela se foi o sotaque de colona alemã de que eu gracejava quando adolescente, mas que foi o mais próximo do alemão que eu cheguei.

Com ela se foi a felicidade de finalmente ser bisavó, por tempos negada por todos os netos, que iam atrás de seus sonhos pessoais.

Com ela se foi a vontade de ser independente, mesmo aos 83 anos.

Com ela se foi a receita de massa recheada que eu nunca pedi.

Mas, principalmente, com ela se foram os desejos, as vontades, os sonhos, a felicidade, as receitas, os pontos, os carinhos, o sotaque, as histórias, as possibilidades de uma jovem alemãzinha de Teutônia que formou uma família com o meu avô.

Porque, como disse Gertrude Stein,

Nós, vivendo agora, somos sempre para nós mesmos homens e mulheres jovens. (…) Estamos esgotados e estamos velhos, e sabemos disso no nosso trabalho e no nosso pensamento, e quando falamos muito, e podemos vê-lo somente olhando no espelho, e mesmo assim nós somos um tempo realmente pequeno velhos para nós mesmos no nosso íntimo, velhos como homens velhos e mulheres velhas uma vez foram e ainda são para o nosso íntimo. Não, ninguém pode ser velho assim para si mesmo em seu íntimo. Não, precisa ser sempre como homens e mulheres crescidos e jovens que nos conhecemos nós mesmos e nossos amigos no nosso íntimo.

Minha vó faleceu hoje e, apesar de eu não esperar imortalidade, sua mortalidade me lembrou da minha.

ps.: já faz alguns dias que minha vó faleceu, mas só agora consegui publicar este texto.