Uma amiga tinha como Diretor um cara daquele Movimento do Triângulo. Sabe? O que só vai se apresentar quando você estiver preparado? A Igreja Misteriosa. Carro adesivado para mostrar que é um ser iluminado, papo sobre energia, vamos os abraçar, cantar Kumbaya, pensar no mundo e o escambau.
Ela adorava o Diretor. Foi transferida de área, promovida, recebeu aumento, ganhou curso de liderança caríssimo – daqueles que tem que colocar no currículo nem que seja para esnobar – tudo por conta do guru da energia.
Aos poucos, contudo, algumas coisas engraçadas começaram a acontecer. Um olhar mais profundo. Um pedido para ir à sala apenas para conversar. Um abraço 2 segundos longo demais.
Uma mão na perna sob a mesa na sala de reuniões.
Uma porta trancada após a sua entrada.
Ela se apavorou. Procurou o RH – que se fingiu de morto. O tal Diretor Guru era alto funcionário de anos de empresa e relações íntimas com a liderança fora do país. A ex-chefe tinha passado pelo mesmo problema, e só havia se livrado quando mudou de área. Conforme ela ia pesquisando, os casos de assédio pululavam.
A história terminou como esperado para elos: o mais fraco, quebra. Foi convidada a se retirar da empresa, e o guru permanece lá, belo e faceiro, apenas procurando um novo alvo.
Parece que a hipocrisia anda rondando o nosso mundo, não? A pessoa fala fala fala sobre coisas bonitinhas – mas fazer que é bom, necas.
Exemplos como o da minha amiga, tenho aos montes na minha vida: gente que fala de compreensão aos quatro ventos – e é mega exigente em casa. O chefe – que vivia dizendo que tínhamos que nos aproximar das equipes, e saber o que acontecia nas vidas deles – era o cara mais isolado, colocando ao seu redor um muro (real e imaginário) de isolamento.
Ah, e o mal dos nossos tempos: a mãe agressora e maldosa que só posta fotos lambendo as crias nas mídias sociais, e posa de galinha choca para aplausos do mundo.
Parece, infelizmente, que a régua é mesmo baixa para o homem e a mulher modernos. Uma pesquisa realizada com Filósofos professores de Ética mostra que mesmo quem ensina, digamos, Caridade, não é mais Caridoso.
A chance de um Filósofo professor de Ética e de um professor de Educação Física serem vegetarianos é a mesma. Mesmo que o Filósofo professor de Ética concorde com Peter Singer de que o vegetarianismo é a atitude mais moralmente correta.
No passado, os filósofos ERAM a própria filosofia.
Buda renunciou a seus bens ao falar de desapego. Confúcio ensinou pessoalmente a discípulos de qualquer classe social enquanto falava do poder do ensino e foi benevolente ao falar de benevolência. Jesus lavou os pés dos discípulos e acolheu prostitutas ao falar de compaixão. São Francisco de Assis abandonou uma vida de prazeres mundanos e dedicou-se a ajudar os pobres, tornando-se ele mesmo um pedreiro e fundando uma Ordem que vivia de esmolas.
Hoje, contudo, parece que estamos vivendo a era do muito falar, pouco fazer.
Pense na sua vida. Quantas vezes você faz o que prega? O que lhe impede de ser realmente aquela pessoa bacana que faz declarações de amor a Deus, a seu par, aos animais ou ao país/estado/cidade onde mora?
Não estamos ficando muito confortáveis na noção de que “apenas Deus é perfeito” e que somos “destinados à imperfeição” – e na cola, deixando que linchamento, racismo, homofobia, alienação, brutalidade, pedofilia e desrespeito ocorram livremente?
Poderíamos estar, em pleno século XXI, um pouco mais críticos conosco mesmo? Elevando a régua da sociedade?
Por que, quando alguém nos diz “isso é machismo” ou “isso é homofobia” ou “isso é bullying”, temos a tendência de responder: “parem com o mimimi”? Não deveríamos estar nos preocupando com a moral da sociedade como um tudo – e abraçando estas mudanças nós mesmos, entendendo que tais exclusões não fazem mais sentido à luz do conhecimento atual?
Sócrates dizia: “o próprio sábio cora das suas palavras, quando elas surpreendem suas ações”. Parafraseando um amigo: não importa o que você diz, e sim o que você faz.
Para uma pessoa das palavras, esta foi uma pílula dura e necessária de engolir.
E então, não estou me retirando do assunto.
Tinha um texto escrito sobre como lido com certos traços não tão guti-guti da personalidade da Sara – birras – guardando há umas semanas.
Por quê?
Queria ver se eu faço mesmo aquilo que eu digo que faço.
Basicamente, se não estava sendo hipócrita.
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2 comentários sobre “SER O QUE SE PREGA – NEM QUEM ENSINA ÉTICA DÁ EXEMPLO HOJE EM DIA”